Texto por: Ingrid Sateré Mawé
Muitas vezes você busca a receita do bem-viver em um livro! Mas o conhecimento do bem-viver, no meu ponto de vista, está além de um conhecer teórico escrito no papel, o saber do bem-viver é aprendido na prática do dia a dia.
Para nós indígenas, o conhecimento está escrito no próprio corpo, na busca da satisfação de nossas necessidades através da caça, pesca, colheita… Quando nosso corpo precisa cicatrizar, curar feridas, dores e humores, é nas ervas e plantas que a própria natureza oferece que buscamos cura. Não quero dizer aqui com minhas palavras que a ciência ocidental não é necessária. Mas, gosto de afirmar que esse bem-viver passa pela crença de que há um conhecimento ligado à própria natureza, ela mesma com seu próprio espírito que vai além da ciência humana, onde se domina o saber e o oferece aos nossos povos.
Esse bem-viver vai sendo passado de geração em geração em um movimento que sobrevive há milhares de anos, repetido sempre nas histórias dos nosso maravilhosos antepassados.
A fórmula para compartilhar nosso bem-viver tem dado muito certo ao longo dos anos. Com o processo educativo, nossas crianças entendem seu lugar no mundo vivendo e observando o meio em que vivem, percebendo a existência dos seres encantados que habitam e se comunicam com cada indivíduo. O bem-viver se pauta no aprendizado pela educação do corpo, da mente e do espírito. Esse é o modo indígena de criar o universo em que vive.
O bem-viver na floresta ou na cidade se dá pela necessidade do conhecimento de si, de seu lugar da natureza do universo e pela certeza de que formamos, com o mundo, uma coisa só, e não de que somos os seus donos.
Precisamos sentir o sentir e viver o belo, para nos conectar com a real existência. Na minha, mas simples, compreensão, isso é o conhecimento do bem viver.
As próprias culturas indígenas são o melhor exemplo de que “outro mundo é possível”, pois conseguem ainda no início deste século XXI, marcado pela desigualdade e uniformização das mercadorias, do consumo e dos desejos, construir sociedades igualitárias, sem marginalização e sem exclusão. Nas palavras de Egon Heck e Guenter Francisco Loebens (2012, p.61):
“Os povos indígenas chegam ao início do século XXI não apenas como sobreviventes, mas como povos com ricas culturas e sabedoria milenar. É a partir daí que se constituem em importantes atores sociais, políticos e étnicos, trazendo importantes contribuições na construção de novos projetos de vida nos distintos países.”
E eu tenho total acordo e cada dia de levante contra toda tentativa de nos dizimar continuamos nos fortalecendo e buscando a força ancestral, a qual nos mostra que precisamos entender que a importância do paradigma do Bem Viver não está na realização imediata de uma ruptura, mas na retomada de um horizonte – um futuro com justiça e igualdade. A luta indígena pelo Bem Viver faz parte de uma ampla aliança pela preservação da vida no planeta Terra. Para pensar em Bem Viver é necessário beber da fonte ancestral, mas isso não significa fazer uma leitura impossível do passado, e sim pensá-lo como tempo que respalda a contínua produção do presente e do futuro.