A literatura nativa como defesa cultural

Texto por: Olívio Jekupé

Quando eu era criança, via muitas histórias na tevê e jornais que mostravam muitos problemas com povos indígenas. Havia muitas mortes, sem contar os muitos casos que não mostravam, o que me deixava revoltado. Por isso é que, quando comecei a escrever, gostava de mostrar os problemas que acontecem. Os anos de 70 e 1980 foi uma época triste no Brasil, a ditadura com os povos indígenas foi severa, e por isso comecei a ser um escritor crítico, mas pouco consegui publicar, a não ser o livro Xerekó Arandu, A Morte de Kretã, um livro que conta a história de um líder que foi assassinado. Foi vendo essa história que concluí que tinha que mostrá-la. Mas é difícil publicar livros assim, e então fui obrigado a começar a escrever livro infantil, também muito importante, mas aqueles que problematizam também são, contudo não se consegue publicar.

Aliás, Xerekó Arandu é um livro que consegui publicar somente uma vez e não teve mais um retorno de reedição. Percebi que muitos professores tinham medo de trabalhar com esse livro, e por isso os outros livros de literatura infantil e juvenil, meus e de outros autores, sempre foram mais trabalhados. E eu ficava triste com isso, porque minha intenção era mostrar o assassinato de um grande líder, algo que tinha que ser mostrado para os alunos, pois do contrário a história de luta desse grande líder seria esquecida, já que no Brasil as grandes histórias das pessoas que lutam por um ideal sempre é esquecida. E eu como escritor tinha essa grande missão de não deixar esse caso no esquecimento.

Dessa forma, tanto eu como outros escritores indígenas temos uma grande missão, que é conscientizar a sociedade e mostrar os problemas que acontecem pelo Brasil, e ao mesmo tempo mostrar uma cultura diferente e com isso valorizar nossos povos.

Sei que não é fácil, mas essa missão nós recebemos e temos que aproveitar e escrever sempre algo novo para que as coisas possam mudar, e quem sabe diminuir o preconceito que sofremos desde 1500. E como sou escritor, acredito que nós não escrevemos por acaso, por isso continuaremos. E que nossas histórias sejam respeitadas!

Por tudo isso, acredito que no mês de Agosto, em que se fala sobre as questões indígenas, temos que aproveitar e divulgar de várias formas nossas lutas, que aliás são várias pelo Brasil. E é preciso mostrar tudo. Inclusive, como eu sou escritor, espero que falem dos meus livros e que muitos possam ler e entender melhor a questão indígena, e também de outros autores, que são inúmeros pelo Brasil.

Tenho 22 livros já publicados. Queria muito que eles estivessem em várias escolas pelo nosso País, mas na verdade não estão. Não sei se existe um pouco de preconceito com autores indígenas, pois se não tivessem, talvez muitas secretarias municipal, estadual, e mesmo o MEC, já teriam comprado vários livros meus e de outros autores.

Sei da importância de um livro escrito por indígena, e consequentemente acredito que deveriam ter vários nas escolas para que as crianças possam entender melhor o mundo indígena e de vários povos. E com livros nas escolas, tenho certeza de que as crianças cresceriam com uma mentalidade diferente, diferente dessa que vemos, a qual todos têm medo de nós indígenas.

Vivemos numa nova era, e muitos não entendem que nós indígenas também podemos escrever, que podemos falar o que pensamos. Por isso, nesse mês de Agosto, aproveitem pra trabalhar muito sobre a questão indígena. E sempre falo que vocês que trabalham sobre as nossas questões, vocês são muito importantes, porque o Brasil, o País, tem uma população imensa, e nós indígenas somos um grupo pequeno, mas com o apoio de muitos, divulgando e trabalhando sobre isso, irá contribuir muito para o crescimento do pensamento do povo brasileiro com uma visão diferente.

Inclusive, a literatura nativa tem que ser falada nas escolas sempre, e não só no mês do Agosto indígena, mas no ano inteiro, para que assim vários possam entender melhor sobre nossa realidade. Assim poderão lutar também juntos pela mesma causa, como exemplo a demarcação das terras indígenas. E também quero lembrar que agora em Agosto teremos vários indígenas lutando contra essa nova lei que querem aprovar, a PL 490, um absurdo! E por isso é que o livro pode ser uma das formas de conscientizar as pessoas a entender melhor as problemáticas do nosso povo, e assim serem nossos apoiadores e não nossos inimigos como muitos são, principalmente ruralistas e muitos políticos, que só nos criticam e querem nos explorar.

Por isso, mesmo os que não forem para Brasília no ato que vai acontecer, é preciso o apoio de todos os indígenas, lutando de longe, mesmo divulgando, e o apoio da sociedade. E eu, como escritor, escrevendo, mas também estarei lá na capital do Brasil e fazendo minha parte.